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  A defesa do mar profundo: o novo teatro de operações da NATO e UE   

in Observador em 16/1/25

A recente visita do Secretário-Geral da NATO, Mark Rutte, ao Parlamento Europeu deixou bem vincada a importância do reforço da cooperação entre a NATO e a União Europeia (UE), num tempo em que os desafios à segurança comum são muitos e de origens variadas. Rutte enfatizou que não estamos a investir o suficiente na nossa segurança e defesa, deixando subentendido que valores de investimento anuais inferiores a 3% do PIB são insuficientes. Salientou, igualmente, que as ameaças não provêm, exclusivamente, da fronteira de leste.

A UE enfrenta desafios crescentes em matéria de segurança e defesa, num cenário global marcado por tensões geopolíticas e ameaças híbridas cada vez mais sofisticadas. Entre estas, destaca-se a vulnerabilidade das infraestruturas submarinas, nomeadamente os cabos de telecomunicações e de energia, que constituem a espinha dorsal das comunicações globais e da economia moderna.

Apesar de não serem literalmente visíveis, estas infraestruturas são fundamentais para a estabilidade económica e política da região euro-atlântica. A rede global compreende, aproximadamente, um milhão de quilómetros de cabos submarinos a interligar os 5 continentes. Estima-se que estes suportem mais de 97% do tráfego global de Internet, desempenhando um papel vital para as operações governamentais, transações financeiras e comunicações pessoais. Além disso, os cabos energéticos submarinos facilitam a integração de redes elétricas, promovendo a transição energética e o transporte de energia de uma forma mais eficiente. No entanto, a localização física destes cabos é amplamente conhecida, tornando-os vulneráveis a ataques e acidentes.

Reconhecendo a importância estratégica destas infraestruturas, o Secretário-Geral da NATO relembrou os ataques de novembro de 2024, quando foram cortados dois cabos submarinos que ligavam a Suécia à Lituânia e a Finlândia à Alemanha, no Mar Báltico, e que ilustraram, de forma alarmante, a fragilidade destas infraestruturas críticas. Estes episódios, atribuídos a atos de sabotagem, evidenciam a necessidade urgente de uma resposta coordenada e eficaz para proteger não só estas, mas todas as infraestruturas vitais.

Rutte destacou a importância de um compromisso financeiro robusto para a defesa, com uma parte significativa dos recursos direcionada para a segurança de infraestruturas sensíveis, como os cabos submarinos. A NATO, por seu lado, reforçou, esta semana, o seu compromisso com a segurança marítima através de iniciativas como a Baltic Sentry, que visa aumentar a vigilância e a proteção no Mar Báltico, uma região de crescente importância estratégica devido às tensões com a Rússia e ao papel vital que o mesmo desempenha nas comunicações e no transporte de energia, entre a Península Escandinava e o resto do Continente Europeu. Esta operação combina patrulhas, exercícios conjuntos e tecnologias de monitorização, tais como drones, submarinos, navios patrulha e aviões, para proteger estas estruturas de ataques deliberados.

Por outro lado, os desafios não se restringem ao Mar Báltico. Também no Mar Mediterrâneo, mas sobretudo no Oceano Atlântico, observamos desafios reais à proteção das infraestruturas. Portugal, pela sua posição geoestratégica, tem um papel crucial neste esforço coletivo para proteger as infraestruturas no Atlântico. Estima o Professor Luís Bernardino que cerca de 15 a 20% dos cabos submarinos passam, atualmente, na zona de soberania marítima portuguesa. Em concreto, projetos como o “EllaLink”, que ligam Sines a Fortaleza, no Brasil, são fundamentais para ligar a Europa com a América do Sul e representam uma responsabilidade de proteção, direta, para Portugal.

A cooperação entre a NATO e a UE é essencial para garantir que infraestruturas como o “EllaLink” estejam protegidos contra ameaças de natureza diversa, desde desastres naturais até atos de sabotagem. Neste sentido, a NATO tem dado passos significativos, incluindo a criação de uma Unidade de Coordenação de Infraestruturas Críticas Submarinas. Para a União Europeia, investir na proteção destas infraestruturas é uma questão de segurança, de soberania e de resiliência. Em tempos de incerteza, garantir a segurança de cabos submarinos é essencial para preservar a estabilidade económica e política da região euro-atlântica e para fortalecer o papel da Europa como ator global.

No entanto, estas infraestruturas representam não só desafios, mas também oportunidades, que justificam o investimento massivo, tanto no seu desenvolvimento como na sua segurança. A importância económica destas infraestruturas também foi destacada por estudos da Autoridade Nacional de Comunicações, em Portugal, que sublinhou o potencial dos cabos submarinos para impulsionar a economia digital do país e atrair investimentos estrangeiros. Portugal pode posicionar-se como um hub global de ligações submarinas, centros de armazenamento de dados e energia verde, aproveitando a sua localização privilegiada e as novas ligações transatlânticas para liderar em inovação e segurança tecnológica.

Em conclusão, garantir a proteção dos cabos submarinos é essencial não só para preservar a estabilidade económica e política da região euro-atlântica, mas também para fortalecer o papel da UE como ator global. Este é mais um exemplo claro de como o investimento em segurança e defesa é fundamental para garantir a nossa soberania e competitividade económica.

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