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 Portugal, União Europeia e Brasil: Uma trilogia virtuosa

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in Observador em 23/02/25

A XIV.ª Cimeira Luso-Brasileira, que decorreu esta semana em Brasília, e os 19 acordos bilaterais que foram assinados são uma excelente forma de assinalar os 200 anos das relações diplomáticas entre Portugal e o Brasil. A expectativa é que esta relação se aprofunde e se expanda ainda mais com a entrada em vigor do Acordo União Europeia-Mercosul, onde Portugal pode ser a “pedra de toque”.

O Brasil é muito mais que uma potência regional sul-americana. É o quinto maior país do mundo em área, com a 12.ª maior economia, um dos maiores exportadores de matérias-primas críticas, como o lítio, a grafite e o nióbio, indispensáveis para as transições verde e digital, para as quais estamos a trabalhar, afincadamente, na Europa​. 

Os compromissos assumidos em Brasília entre os Governos de Portugal e do Brasil, em áreas como a defesa, segurança, justiça, ciência, saúde, comércio, energia e cultura, abrem novas oportunidades para os cidadãos e para as empresas de ambas as partes. Diria que podem funcionar como o “aquecimento” e o banco de ensaio para o Acordo do Mercosul. 

A garantia do Primeiro-ministro português que, independentemente das futuras decisões sobre a privatização da TAP, as rotas entre Portugal e Brasil serão mantidas, é um compromisso que devemos valorizar.

Atualmente, mais de meio milhão de brasileiros residem em Portugal e cerca de 150 mil portugueses vivem no Brasil. Portugal acolhe a segunda maior comunidade brasileira no exterior. Sabemos a importância que as comunidades estrangeiras têm, neste momento, no nosso país, em termos de crescimento da população e de dinamização da economia. Sabemos, igualmente, que o investimento e a cooperação na área da segurança são uma prioridade de ambas as partes, pelo que saúdo, também, o acordo de cooperação no domínio da investigação e combate à criminalidade organizada transnacional e ao terrorismo. O objetivo é reforçar o combate ao crime organizado, através da troca de informações e de dados, bem como da realização de investigações e operações conjuntas entre as forças policiais e de investigação de ambos os países. 

Outro aspeto importante para os cidadãos passa pelo reconhecimento das qualificações de licenciados, em especial engenheiros. Já na anterior Cimeira Luso-Brasileira, ocorrida em Portugal, em 2023, acordou-se a equivalência de estudos de ensino básico/ fundamental e médio/ secundário.

As empresas também ganham com estes acordos que, de uma forma geral, promovem as relações comerciais e fortalecem a competitividade. A harmonização de normas e de certificações para facilitar o comércio, o crescimento sustentável do turismo, a conetividade logística entre portos, a cooperação no setor agroalimentar e na exportação de vinhos favorecem o intercâmbio entre Portugal e o Brasil. 

Conjugando os dados do Eurostat com os da AICEP – Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal, E. P. E., Portugal é o Estado-Membro da União Europeia (UE) que, em termos relativos, mantém mais trocas comerciais regulares com o Brasil, importando combustíveis e minerais, produtos agrícolas e alimentares e exportando produtos agrícolas, veículos e transportes e produtos alimentares, sendo que atualmente existe um deficit comercial de 2,6 mil milhões de euros para o nosso país. Quanto a valores absolutos, os Países Baixos lideram as importações e a Alemanha as exportações.

A União Europeia é o segundo principal parceiro comercial do Brasil, sendo responsável por 15% do seu comércio total. Por sua vez, o Brasil é o 12.º maior parceiro comercial da UE, sendo responsável por 1,5 % do comércio total da União. Assim, com a entrada em vigor do acordo com o Mercosul, a Europa vê aberta a porta de entrada num novo mercado de 273 milhões de consumidores. As empresas europeias pouparão cerca de 4 mil milhões de euros por ano, em tarifas alfandegárias, um impulso crucial num momento em que a competitividade global é mais desafiante do que nunca​. Entre estas empresas beneficiárias, estão as mais de 30 mil pequenas e médias empresas europeias que, atualmente, mantêm negócios com países do Mercosul. 

Ora, esta aproximação entre Portugal e Brasil, que foi descurada durante o mandato de Bolsonaro, é, igualmente, uma oportunidade para o nosso país se afirmar na UE como um interlocutor privilegiado com o Brasil. Este posicionamento reforça a relevância de Portugal na definição de um espaço económico mais integrado, ao mesmo tempo que projeta a sua importância estratégica no contexto europeu. ​

Portugal encontra-se numa posição geoestratégica singular para potenciar a parceria EU-Mercosul, não apenas pelo seu papel histórico e cultural nas relações com o Brasil, mas também pela sua rede de portos e pelo acesso privilegiado às principais rotas marítimas globais e, acima de tudo, pela partilha da língua portuguesa. Como elo natural entre a Europa e o Atlântico Sul, Portugal pode, ainda, assumir-se como um hub logístico, tecnológico e comercial, facilitando o fluxo de bens e serviços, entre os dois blocos. 

Na área empresarial, foram, ainda, anunciados a instalação de um escritório da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos – Apex, em Lisboa; a confirmação da compra de 12 aeronaves Super Tucanos pela Força Aérea Portuguesa e da parceria entre a OGMA – Indústria Aeronáutica de Portugal e a Embraer para adaptação das aeronaves a padrões da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO); a abertura de um escritório da Embraer Defesa e Segurança, em Lisboa; e a criação de escritório de cooperação do Ministério das Relações Exteriores do Brasil, em Lisboa.

Além das relações comerciais, a Cimeira desta semana trouxe outras novidades, em termos diplomáticos, como a criação de mais sete consulados portugueses, cinco dos quais no Brasil. 

Podemos concluir que, em termos bilaterais, Portugal e o Brasil se aproximaram, estreitaram relações e mostraram ter uma visão clara do futuro, comprometida com a justiça, a segurança, a educação, a cultura e a sustentabilidade. Adicionalmente, Portugal ganhou créditos para poder ser um pivot na relação UE-Mercosul, onde o Brasil representa cerca de 80% desta associação sul-americana.

Hélder Sousa Silva – Eurodeputado PSD/PPE

Presidente da Delegação do Parlamento Europeu para as relações com a República Federativa do Brasil 

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